terça-feira, 1 de maio de 2012

Carnaval - A volta


Dia 07 – domingo

Dia da volta. Ô tristeza. Desta vez ao invés de nos atracarmos com aquela estrada esburacada e escutando histórias pra lá de duvidosas; preferimos a companhia de nosso marinheiro Beto. Ele nos levou de lancha até Camamú e de lá pegamos um taxi de um amigo dele até Ilheus. A favor, tinha um último passeio de barco e uma estrada asfaltada e tranquila.


O amigo de Beto havia levado o filhinho que se mostrou absolutamente mudo e impassível. Carina foi na frente já que a lombar chiava mais que o normal. Atrás fomos eu, Camila e Priscila. E o filho do motorista, em pé entre os bancos, sem se mexer. Puxamos conversa e nada. Falamos que ele podia sentar e nada. Carina foi brincar com ele e inventou de cutucar o menino. Recebemos um grunhido de volta. Foi o máximo de som que conseguimos arrancar dele. E assim foi. Duas horas de viagem e o menino em pé entre os bancos sem se mexer. E assim chegamos em Ilhéus. Camila já entrou na vibe do Rivotril para aplacar o medo do avião e ficamos nós sentadas no aeroporto revendo as fotos de uma viagem que chegava ao fim.

Viajar com os amigos não tem preço. Acho que todas nós precisávamos desta pausa pra enfrentarmos o que vem pela frente. Cada um com seu drama, seus problemas, seus trabalhos e decisões a serem tomadas. Mas pelo menos por uma semana tivemos a sensação de estar tudo em suspenso. Tudo tranquilo aguardando nossa volta. Agora de baterias recarregadas voltamos ao batente. Com a certeza de uma viagem futura (acho que Turquia em agosto!) pra recarregar de novo!



Carnaval - Dia 06


DIA 06 – sábado

Com o passar dos dias percebemos que nosso personagem Aristides não era muito bem quisto na ilha. Às pessoas sempre nos perguntavam alegres e curiosas onde estávamos hospedadas e ante a resposta do nome da pousada, o sorriso se esvaía seguido de um Ah ensurdecedor. Nem precisa perguntar o porque, né?

Conseguimos com uma das inimizades de Aristides uma lancha rápida exclusiva pra nós quatro para todo o dia. Nosso queridíssimo marinheiro se chamava Beto e era uma flor de pessoa. Extremamente educado e preocupado com nosso bem estar.

Camila mostrou que seu medo pelo ar se estendeu pro mar e grudou nas barras da lancha como se sua vida dependesse daquilo. O desespero à cada batida de onda era cômico. Foi mal, Ca; mas era mesmo. Era muita bobagem pra uma lancha só. Narcisa; ops desculpe; Carina não parava de gargalhar e em uma altura tentando se retratar soltou a pérola: “Me desculpe, é que estou bêbada de felicidade”. Eita coisa boa. Mas o perrengue de Camila não durou muito. Aos poucos ela foi se acostumando e logo logo estávamos nas piscinas naturais. Passamos por Murerê e seguimos direto para a vila de Boipeba. Beto, nosso marinheiro, nos falou pra ficarmos tranquilas e explorarmos o lugar o tempo que quiséssemos. Precisávamos apenas voltar antes do anoitecer.



Seguimos então para a vila e logo percebemos que se restringia a duas ruas e muito pouca coisa pra ver. Nas incursões de Carina sobre a vida das pessoas acabamos conhecendo o médico da cidade. Quanta ironia. Ele dois dias antes teria vindo muito mais a calhar. Brincadeiras à parte ele foi muito prestativo. Além de nos contar da vida dele e das dificuldades da vida de um médico em uma vila como aquela, ele também nos mostrou um caminho através de trilhas para as praias mais afastadas. Foi dele a célebre frase: “É só dizer não uma vez que Fudeu a Bahia!”. E com essa lá fomos nós. A trilha era toda de areia. Estranhei por não ver o mar. Tinham várias bifurcações no caminho e nos questionamos algumas vezes se estávamos na direção certa. Mas confiamos no instinto e saímos em uma praia paradisíaca.



Nada de um lado e nada do outro. Apenas o restaurante do Guido no meio. Já tínhamos ouvido falar dele e nosso estômago agradeceu depois de uma longa caminhada. Figurinha o tal do Guido. Apareceu com umas revistas de turismo e aventura com reportagens sobre o restaurante; falou dos artistas e de gente famosa da globo que passa por lá e quando achamos que já tínhamos ouvido tudo ele aparece com uns porta-retratos com fotos dele com gente famosa que nunca vi na vida. Tenho que admitir, Guido estava ali se esforçando ao máximo no marketing e relações públicas. Nota 10!



As lagostas do lugar são as mais famosas então fomos direto nelas. Apesar de apreensivas com o que comer respiramos fundo e enfrentamos o bicho! Delicinha; mas só conseguia pensar na sobremesa. Tenho que admitir que fui bem contida no feriado. Fora o crepe de Nutella com banana; até que consegui me segurar bem no que se referia aos doces. Mas o cardápio praticamente gritava brigadeiro de coco, brigadeiro de abacaxi com coco, cocada, queijadinha.... Estava difícil resisitir e decidir. Camilinha foi logo falando “Na dúvida peça os dois”. E fui. Com a cara e a coragem e pedi os dois. Seguimos então o que já era nossa rotina a esta altura do campeonato. Cochilo, mar e caminho de casa.





A volta pelas praias se mostrou maravilhosa e valeu por toda a viagem. Cada canto era bonito e intocado. A sensação de que estávamos sozinhas o tempo todo era única. Mas ainda bem que não estávamos. No fim de uma das praias não conseguíamos ver forma de atravessar que não fosse pelas pedras. Começamos a subir mas a combinação havaianas e pé molhado não estava ajudando. Eis que veio um casal pisando firme e entrou na mata. Nos entreolhamos e imediatamente pensamos a mesma coisa. Devem achar que somos loucas subindo por estas pedras! Deve ter uma trilha por dentro da mata! E lá fomos nós seguir o casal resoluto! A trilha era linda! E passava ora na mata, ora pela praia. Tiramos fotos de tirar o fôlego e não cansávamos de agradecer pelo dia que estávamos tendo.

Quando começamos a questionar novamente se estávamos no caminho certo percebemos que tínhamos dado toda a a volta na ilha e encontrado Beto pelo lado oposto. Ele estava lá, como aquela tranquilidade baiana inabalável. Tomamos um banho de rio e subimos na lancha de volta! O retorno pelo rio foi um presente no fim de tarde. Os mangues, a água lisa de um azul profundo, o labirinto de caminhos... Às vezes a gente se esquece de como o Brasil é bonito.

Quase chegando no píer, Camila teve a brilhante idéia de perguntar a Beto se ele poderia nos deixar na Ponta do Mutá ao invés do Cais. Fomos prontamente atendidas e em dois minutos estávamos lá. A Ponta do Mutá é conhecida por ter o por do sol mais bonito da região. Eu sei, eu sei. Falei disto todos os dias; mas tinha melhor forma de fecharmos nosso último dia do que com isto? E os boatos eram verdade. Quase dava pra ouvir o som do sol se pondo. De matar! Fomos pra pousada de alma lavada!





Depois do banho, todas sentiram o peso do dia. Estávamos destruídas do sol e das batidas do barco. Minha coluna já chiava de novo e Camilinha estava com o braço direito vermelho como pimentão. Entre ais e uis fomos jantar implorando por uma cama. 

Carnaval - Dia 05


DIA 05- sexta

Todas estavam animadas! Sem dores, sem zigueziras! Fomos então fazer nosso passeio de bicicleta já programado até Traipú de Fora! Sabe aquelas idéias que são lindas e românticas no papel e completamente diferente na vida real? Imaginem nós andando sobre a brisa do mar de bicicleta com a água batendo em nossos calcanhares; rindo e fazendo zique zague pela areia. Então. Não foi isso. Foi aí que a Priscila entrou no look boquinha nude.



Agora, the real deal: A areia deixa a bilcleta super pesada; e ela não tem marcha pra tentar aliviar. Nos primeiros cem metros você percebe que aqueles quarenta minutos de esteira na academia não te preparam para a taquicardia seguida de falta de ar e queimação nas coxas que se seguem. O adorável sol queima a pele e a brisa não é suficiente para te tirar a sensação de que está no deserto do Sahaara e chegou a sua hora. As paradas para beber água e achar uma sombra se tornaram frequentes e a gente não sabia se ria ou se chorava. Priscila estava completamente branca e achava que não ia conseguir continuar. Eu também tinha minhas dúvidas se chegaria ao destino. 



Carina que há um dia estava debilitada agora se mostrava forte como um touro, como uma líder de torcida. “Vamos! A gente vai conseguir!” “Só mais um pouco!” . Confesso que estava tentando me manter positiva. A paisagem era realmente linda e em alguns trechos foi realmente divertido e me senti abençoada. 



Eis que estávamos todas naquele vai ou não vai e me passa um moreno alá BayWatch! Veio correndo lá do fundo, com um par de pé de patos na mão e um cachorro lindo atrás. Passou por nós e se tínhamos alguma dúvida ela se esvaiu naquele momento. Montamos na bicicleta e fomos atrás. A cena não podia ser mais ridícula! Aquele moreno correndo na nossa frente e a gente se matando em cima daquelas bicicletas tentando não perde-lo de vista! Se não fosse por ele nunca chegaríamos. Mas eis que ele nos vence e some. Continuamos andando e nos deparamos novamente com ele, só que desta vez fazendo abdominais enquanto o cachorro aguardava em uma piscina natural no mar. A cena da abdominal... Bem. Então. Isso aí mesmo! Mas a gente não podia parar. Seria muita cara de pau. Então continuamos. E ele nos alcançou mais à frente e nos ultrapassou. Ultrajante. Daí vocês já imaginam nosso ritmo. Enfim chegamos à Traipu de fora! E Val estava nos esperando com nossas espreguiçadeiras à sombra e música eletrônica no fundo. Devolvemos as bicicletas e nos estatelamos o resto do dia! Rindo sobre que tínhamos acabado de fazer e sobre a possibilidade de desmaio da Priscila; nos lembramos daquele filme “Um morto muito louco”. Só quem tem a nossa idade e assistiu muita sessão da tarde vai saber do que estamos falando. Imaginamos nós, carregando Priscila pelas paisagens e tirando fotos com ela desmaiada como no filme. Hahahahahaha! Esta figura de linguagem entrou em várias situações depois.

O por do sol foi de tirar o fôlego mas isso já está virando pleonasmo. Desta vez conseguimos uma jardineira pra voltar e a viagem se mostrou até relativamente curta comparada com nossa última recordação.



À noite fizemos um programa light e começamos a nos preparar para o passeio à Boipeba que faríamos no dia seguinte.

Carnaval - Dia 04


DIA 04 – quinta

O dia amanheceu melhor que a encomenda. Chovendo. Sério. Era tudo que a gente podia ter pedido neste dia. Carina acordou bem melhor e parecia se recuperar bem; mas ainda fraca e nenhuma de nós teria coragem de deixa-la sozinha na pousada. Assim sendo, enquanto ela se recuperava se entupindo de biscoito maizena e chá de boldo, ficamos todas na varanda lendo nosso livros e jogando conversa fora.

Eu já estava ficando aflita com a Biografia do Eric Clapton que estava lendo e estava louca pra acabar. Tudo isto pra pegar o livro que a Carina estava terminando que me parecia um romance desses que toda menina gosta. Só pelos suspiros dela enquanto lia já fiquei com vontade de pegar.

Camila relembrou os tempos de câncer e sempre me orgulho dela por ter vencido esta luta. Me dói o coração escutar por todos os medos que ela passou e perceber que no fundo no fundo o que mais dói é a possibilidade de não ter perto as pessoas que a gente ama. Seja porque nós iremos deixa-las ou porque elas nos deixarão. Até hoje me impressiono quando olho pra ela tão cheia de vida! Camila é um turbilhão de sentimentos! Vive tudo intensamente. Quando sofre, sofre. Quando ri, ri. É amiga quando precisa e fala o que você não quer ouvir, mas que não deixa de ser verdade. É verdadeira no último grau!



Quando a chuva deu uma trégua e vimos que Carina já estava bem. Fomos dar uma volta na praia e chegamos até o Deck, de nosso amigo Didi. Ficamos esperando nosso adorado por do sol enquanto escutávamos Barão Vermelho passando o som pro show da noite.

O por do sol de Barra Grande é o mais bonito que já vi. O tom que tudo toma no cair do dia é de cair o queixo. Os coqueiros ficam mais verdes e o mar fica mais azul. O amarelo que o sol joga nas coisas é de tirar o fôlego. Me peguei várias vezes suspirando olhando a paisagem e normalmente neste horário o silencio imperava entre nós. Quase que uma referencia à tanta beleza.



À noite, resgatamos Carina e fomos a uma creperia de dois franceses. Como descrever o dono? Mmmmmmm..... Então. É. Pois é. Isso aí. Coisa linda de mamãe. Depois de tantos dias falando bobagens, tivemos um jantar falando sobre política, economia, rumos pro país no futuro. Fiquei sabendo de como o golpe de nossa ministra Zélia na época Collor abateu a família da Priscila. Nem vou entrar no mérito de discutir política aqui; mas só de lembrar já fico vermelha de raiva. E pensar que ele foi reeleito.

Saímos cansadas mas não podíamos perder o show. Não tínhamos feito nenhum programa noturno mais agitado. Sinal da idade. Então fomos firmes e fortes. Ouvimos a famosa banda mestiço abrir o show mas estávamos caindo de sono. Resolvemos que iríamos assistir só às duas primeiras músicas do Barão e iríamos embora. Mas eis que Danilinho chega. Êeeeee!!!!! E em seguida sua namorada! Ahhhhhhhhh! Que frustração! Mas eis que chega o vendedor de salada de fruta! Nem comentei dele, porque era de Priscila. Mas também com namorada! Ahhhhh!!!! Ô turminha comprometida! Confesso que o Danilinho da minha imaginação era bem mais bonito que o da realidade. Então eu fingi que não o vi e fiquei com a imagem que tinha em mente.

No fim das contas o show do Barão foi fantástico! Tocou de tudo dos anos 80 e ficamos até o final! Dançamos do início ao fim e ficamos fiéis a nossa amizade sem nenhuma desgarrar do grupo em função de um rabo de bermuda. Aqui que fala é a recalcada, invejosa que não ficou com ninguém.

Carnaval - Dia 03


DIA 03 - quarta

Devidamente medicada e após um noite bem dormida, preciso dizer, por todas; fomos em direção à Traipú de Fora. Subimos em uma jardineira que foi um desafio para minha coluna recém-estabelecida. Mas estava confiante no poder dos remédios e realmente cheguei lá sem dor. Logo nos deparamos com Buddha Bar. Isso era vida. Colchões brancos, embaixo da sombra, com almofadas, caipirinha e muita mordomia. Os garçons eram extremamente elegantes em seus chapéus panamás e camisas sociais abertas. 



Apesar da agilidade felina que não poderia faltar ali, o bom atendimento compensava a demora dos pedidos. Àquela altura já havíamos entendido que tínhamos que pedir as coisas meia hora antes de realmente deseja-las. Se seguíssemos este raciocínio conseguiríamos manter nossa paz tibetana. Pedimos uma moqueca de camarão que estava de lamber os beiços e seguimos com um belo cochilo enquanto aguardávamos o por do sol. 




Na hora de ir embora Carina vestiu seu look nude que a acompanharia noite adentro. Devolveu toda a moqueca ali mesmo no Budha. É claro que nada é tão simples quando estas coisas acontecem. As jardineiras de volta já tinham acabado e tivemos que pegar um taxi que consistia em um uno, com os bancos molhados, vidros que não abriam direito, um motorista carrancudo que nada lembrava da hospitabilidade baiana e um dvd de axé pra lá de duvidoso. Carininha no banco de trás mal conseguia se aguentar no sacolejo daqueles buracos e a viagem nunca pareceu tão longa pra todos nós. Ficamos repassando o que ela poderia ter comido de mal e um medo se instalou em nós. Tudo parecia suspeito. E então começou a aventura pessoal de Carina entre a cama e o trono. Dava dó. Camila ficou com ela enquanto eu e Priscila fomos até a Vila pra jantar.

No restaurante conhecemos umas figuras que ainda veríamos muito por lá. Os Mestiços. Este era o nome da banda que tinha vindo de Belo Horizonte pra passar a temporada em Barra Grande. Aliás nunca vi tanto mineiro por lá. Jantamos ao som do rock nacional, bem anos 80. Demos uma volta na vila e paramos no MC Didi para comprar o suco de Siriguela encomendando por Camila. O MC Didi fica em uma das principais pracinhas da cidade (têm duas) e é do mesmo dono do Deck, que havíamos ido outro dia. Eis que estamos lá aguardando a moça preparar o suco atrás de um combi de cenário quando escutamos tocar no coreto da praça; nada mais, nada menos que a banda Mestiço! Chega a ser engraçado. Imagina uma rua com dez restaurantes. A banda toca em todos em horários alternados. Se vc fizer um passeio por lá à noite vai ficar com a sensação surreal que está vendo um grupo de clones em todos os lugares. Fomos embora, com a dica do Didi “Não se esqueçam que amanhã tem show do Barão Vermelho no Deck. Ah, quem vai abrir o show é a banda Mestiço”. É fato. Não havia como fugir deles. Eles estavam em todos os lugares.

Quando voltamos pra pousada Carina mantinha firme sua batalha com o trono. Começamos a questionar o que faríamos se ela não melhorasse. É então que você percebe que ao enfrentar uma viagem roots, sem infra, isto pode te colocar em problemas. O médico da cidade havia se mudado depois de cansar de ser acordado às três da manhã por conta de dores de cabeça da população local. Posto de saúde não tinha. Nossa alternativa seria colocar Carina no carro de nosso amigo Aristides, enfrentar três horas de estrada de terra esburacada até chegar à Ilheus. Isto para uma pessoa que não conseguia deixar de ir ao banheiro por dez minutos; nos pareceu mais tortura que solução.

Unimos todo o nosso conhecimento de situações parecidas, conselhos de mães, avós, médicos e pessoas locais e entupimos Carina de Soro caseiro, remédio pra dor e torcemos pra que melhorasse.